Conselho Empresarial de Turismo e Hospitalidade da CNC

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Capítulo 4

Anos 80 - Constituição e Roleta

De olho na escalada da atividade turística e nas movimentações políticas, mas centrado em fazer do turismo a vanguarda do desenvolvimento econômico e social do país, o Conselho traça seu caminho. Uma das primeiras resoluções dos empresários nessa virada de década é o planejamento de uma estratégia para reabrir os cassinos, demanda antiga do setor, devido ao evidente impacto positivo que causaria na atividade. Desde o dia 30 de abril de 1946, após o Decreto-Lei 9.215, do recém-empossado presidente Eurico Gaspar Dutra (1889-1974), os jogos de azar estavam proibidos no país. À época, o general alegara que “a tradição jurídica, moral e religiosa do povo brasileiro era contrária à prática e à exploração de jogos”.

O inesperado decreto interrompeu de forma brusca o rentável e bem-sucedido casamento entre o cassino e a atividade turística. Nos anos 1920, 1930 e 1940, hotéis de luxo e estâncias hidrominerais contavam com imponentes salões para viajantes endinheirados apostarem e assistirem a espetáculos musicais com os artistas mais cultuados da época. No ato da proibição do jogo, o Brasil somava 71 cassinos, que empregavam 60 mil trabalhadores.

“Os ‘anos dourados’ do turismo brasileiro surgiram a partir de 1920, com os cassinos incorporados aos hotéis de luxo e às estâncias termais, hidrominerais ou climáticas. Aproveitando os recursos naturais, de forma a produzir efeitos terapêuticos, surgiram edificações de porte, locais magníficos de realização de jogos e espetáculos, dignos de atender à alta classe e à elite acostumada à moda e à vida europeia.”

Dario Luiz Dias Paixão, doutor em Gestão e Desenvolvimento do Turismo Sustentável pela Universidade de Málaga (Espanha)


Associação Nacional de Restaurantes (ANR)

Criada em 1990 como Associação Paulista de Restaurantes, a ANR passou a ser nacional a partir de 2007, com as crescentes demandas de empresas de outros estados por temas em comum, como legislação, tributos e negociações sindicais. É hoje referência na representação dos empresários do setor. A ANR representa empresas do setor de food service em suas relações com os poderes públicos, as entidades de classe e a sociedade, contribuindo para os negócios e auxiliando na capacitação de profissionais. São 9 mil pontos comerciais no Brasil, entre grandes redes de alimentação, franquias e independentes.

www.anrbrasil.org.br


A alta sociedade da então capital federal hospedava-se, apostava e dançava nos cassinos do Copacabana Palace, do Atlântico e da Urca, onde Carmen Miranda era a estrela maior. Em Minas Gerais, a sorte era lançada nos faustos hotéis das estâncias hidrominerais do estado. Cidades como Caxambu, São Lourenço, Lambari, Poços de Caldas e Araxá deixavam o anonimato ao oferecer às oligarquias do Sudeste uma combinação de luxo, saúde e entretenimento. Durante o dia, os hóspedes buscavam cura nas águas com propriedades medicinais. Ao entardecer e noite adentro, as roletas giravam a todo vapor.

Nos palcos dos hotéis-cassinos soltaram a voz astros como Grande Otelo, Emilinha Borba, Heleninha Costa e as irmãs Linda e Dircinha Batista. Entre atrações internacionais, a seleção contou com a francesa Edith Piaf, o norte-americano Bing Crosby, a portuguesa Amália Rodrigues, o mexicano Pedro Vargas, o cubano Isidoro Benitez, o francês Jean Sablon e a húngara Martha Eggerth.

Na reunião do Conselho de Turismo de 1º de abril de 1980, na qual se discutiu os passos para retomar a história interrompida em 1946, o conselheiro Milton de Carvalho, do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Rio de Janeiro, ponderou: “Hoje, vem ao Brasil o senhor Frank Sinatra e parece um acontecimento louco”. O cantor norte-americano havia se apresentado no Brasil em janeiro. Carvalho faz, portanto, uma comparação do atual momento com as décadas em que nos cassinos brasileiros eram habituais apresentações de grandes nomes da música nacional e internacional.

Fato é que, 24 anos depois da canetada de Dutra, o Conselho volta suas atenções para o tema. Na reunião, o conselheiro João Firmiano da Silva faz um apanhado da situação dos cassinos no mundo e defende a Proposição 62 sobre a regulamentação e o funcionamento dos jogos de azar.

“A Europa está se amarrando no jogo. O cassino, outrora uma espécie de reserva de caça particular para a classe privilegiada, transformouse num parque público de dimensão continental. Na Alemanha, o número de cassinos duplicou em quatro anos e o total do movimento anual ultrapassou 400 milhões de marcos alemães. Na Espanha, o jogo foi finalmente legalizado e concederam-se licenças para 18 novos cassinos desde 1977. No Reino Unido, 14 milhões de pessoas jogam – só em Londres, há 23 cassinos.”

Conselheiro João Firmiano da Silva


“Portugal tem oito cassinos: o maior no Estoril, e o mais novo no Funchal, na Ilha da Madeira. É, porém, a França que possui a mais longa experiência de jogo. Dos seus cerca de 150 cassinos, o que está obtendo maior êxito fica em Divonne-les-Bains, uma calma cidadezinha a apenas 15 minutos de Genebra [Suíça]. Em 1978, seus lucros totalizaram 81 milhões de francos, um espantoso aumento de 45% em relação ao ano anterior. Como pano de fundo desse imenso sucesso, existe uma elaborada e rigorosamente controlada organização, que poucos olhares estranhos conhecem.”

Firmiano sugere aos conselheiros a criação de uma Comissão de Estudos e Elaboração de Projetos (CEP) da qual participariam representantes da Confederação Nacional do Comércio (CNC), do Conselho de Turismo, da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), da Associação Brasileira de Agências de Viagem (Abav), da Embratur, da Flumitur, da Riotur, além de um representante da imprensa, pela Agência Nacional. O conselheiro estima que o projeto estará pronto em 60 dias e conclui seu discurso com o pedido de que se decida “de imediato” a reabertura dos cassinos nos moldes da legislação francesa, “a mais adiantada no mundo”.

Meses depois, em paralelo à luta pela legalização dos cassinos, o Conselho anuncia 1980 como o Ano do Turismo Latino-Americano. A campanha, lançada em 23 de junho em parceria com o Conselho Nacional de Turismo do México, visa difundir a ideia de viajar pelas Américas. No discurso para noticiar a decisão, o presidente do Conselho, Corintho de Arruda Falcão, lamenta as delongas do governo com a causa turística.


“Durante anos, enquanto outras nações faziam do turismo uma das suas mais importantes, senão a principal, fonte de divisas, esperamos que ele se desenvolvesse de forma espontânea, talvez acreditando que nossas belezas naturais bastassem para atrair milhões de viajantes.”

Corintho de Arruda Falcão, presidente do Conselho de Turismo


Sem deixar de lembrar-se da importância econômica da atividade, Arruda Falcão exalta o papel social da causa turística, levado adiante pelo Conselho, principalmente por meio do Serviço Social do Comércio (Sesc).

“A filosofia que orienta o tratamento diferenciado do turismo, nos últimos anos, inserese no contexto das relações de intercâmbios social, cultural e econômico entre as populações humanas. O estímulo à intensificação desse intercâmbio através do turismo é uma exigência, quer por seus efeitos econômicos sobre as áreas receptoras, quer como meio de racionalizar a difusão e recepção de elementos culturais, incorporandoos às diversas comunidades que se beneficiam do fluxo turístico.”

“Essa concepção do turismo, com uma função mais ampla e abrangente do que a conotação original – de simples atividade ligada às diversões e à recreação para o lazer –, envolve uma gama de setores e atividades econômicas, sociais e culturais, direta e indiretamente. Assim, tornou-se imperativa a integração desses setores de atividades, através de uma ação coordenada, com vistas à maximização dos resultados e à minimização dos efeitos decorrentes da utilização intensiva e inadequada dos bens naturais, documentais e culturais.”

Ao encerrar o discurso – proferido na sede do Conselho, diante do professor René Martinez, diretor-geral para a América Latina do Conselho Nacional de Turismo do México, uma das maiores autoridades no assunto –, Arruda Falcão cita o lema definido para a campanha de lançamento do Ano do Turismo Latino-Americano: toma a minha mão de irmão.

Os braços do Conselho alongam-se e vão além das Américas. Para incentivar o turismo e estreitar laços com empresas alemãs, o Conselho promove em abril o 5º Encontro Econômico Teuto-Brasileiro. A surpresa do evento é a presença de Pelé, apresentado pelo presidente da Embratur, Miguel Colasuonno, como “a figura capaz de despertar o Brasil na imaginação do alemão médio”. Questionado pela imprensa, o dirigente nega haver conversas para o ex-jogador ocupar um cargo na Embratur. “A presença dele foi espontânea”, diz Colasuonno.

Ainda em 1980, as belezas e vergonhas do Brasil são mostradas ao mundo durante a visita do Papa João Paulo II. De 30 de junho a 11 de julho, em sua primeira peregrinação pelo país, o pontífice da Igreja Católica move milhões de fiéis em 13 cidades. No Rio, visitou a favela do Vidigal. Em Teresina, leu uma faixa no meio da multidão: “Santo Padre, o povo passa fome”. Em Manaus, ponto final da jornada, o líder religioso liderou a bordo de um navio da marinha uma procissão fluvial ao encontro das águas dos rios Negro e Solimões, um dos pontos turísticos mais famosos do país.

Um novo programa turístico nasce em 2 de setembro de 1981. Anunciado pelo presidente da Embratur, Miguel Colasuonno, o pacote elaborado em parceria com a iniciativa privada busca reduzir o custo do turismo para visitantes estrangeiros e fomentar o turismo interno. É criado, por exemplo, o Brazil Airpass, uma passagem especial de US$ 330 que permite ao turista estrangeiro viajar por 21 dias em qualquer voo doméstico sem limite de quilometragem. O plano também inclui redução do preço de voos dos Estados Unidos, passagens com descontos para a Argentina, tarifas domésticas especiais para menores de 21 e maiores de 65 anos, voos noturnos econômicos e a revitalização do programa Brasil Turístico, com excursões de São Paulo para 55 cidades, conjugando avião, ônibus e trem.

Com o avanço da crise econômica, em 25 de novembro de 1982, o Conselho convida Luiz Mendonça Freitas, diretor da Embratur, para debater o programa de investimentos da estatal. Antes de falar sobre as verbas destinadas doravante ao turismo, revela dados interessantes a respeito da relação entre trabalho e lazer e como isso impacta a atividade turística e o controle das tensões sociais.

“Apesar das crises e do problema energético, sabemos que a tendência do trabalho é de criar condições para o lazer, condições cada vez maiores para a necessidade de descanso. Tivemos, de 1900 para 1980, praticamente as horas de trabalho reduzidas à metade. Se no começo do século podíamos imaginar que cada pessoa trabalhava pelo menos 60 a 70 horas por semana, sabemos que, mesmo nos países onde não se atingiu um determinado nível de desenvolvimento tecnológico – por exemplo, no Brasil –, dificilmente o trabalhador médio trabalha mais de 40 horas por semana. Em alguns países isto está reduzido a 35 horas.”

“Na medida em que diminuem as horas de trabalho, aumentam as horas de lazer. E também aumentam problemas de outra natureza, as tensões sociais, o que está exigindo o desenvolvimento do setor turístico, que é a válvula de escape, a fórmula pela qual o cidadão hoje pode encontrar distração e caminhar no sentido de reduzir as suas tensões e, em consequência, as tensões sociais.”

“Depois da Segunda Guerra Mundial, esses problemas se aceleraram e sabemos que o número de turistas aumentou no mundo todo de maneira espantosa. Tivemos, só nos últimos 13 anos, baseados nas estatísticas da Organização Mundial de Turismo, uma expansão de 100%. Em 1967, possuíamos 131 milhões de turistas em todo o mundo. Em 1978, esse volume atingiu 260 milhões de pessoas. Se essa taxa se mantiver, o que dependerá obviamente de investimentos no setor e de condições econômicas capazes de sustentar uma expansão desta natureza, poderemos ter 1 bilhão de pessoas como turistas em todo mundo nos próximos anos.”

As atividades triviais do setor mantêm-se no radar dos conselheiros. A par de que o supracitado crescimento do turismo torna fundamental a formação de profissionais especializados, o Conselho, em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), organiza, entre os dias 7 e 10 de dezembro de 1981, um concurso nacional para alunos de hotelaria. O evento acontece no Hotel Nacional, inaugurado em 1972 com a assinatura de Oscar Niemeyer e Burle Marx. Os melhores cozinheiros, barmen e garçons são premiados. “Não se pode mais trabalhar na base do improviso na atividade turística”, diz matéria sobre o concurso em O Globo.

Ao longo dos anos 1980, o Conselho passa a abrir suas portas para palestrantes especialistas na atividade turística. O objetivo é capacitar ainda mais os membros da entidade, atualizálos com informações precisas e debater ideias. Foram motivo de debate temas como marketing, transporte turístico de superfície, Carnaval, museus, imprensa, câmbio e tarifas aéreas. Para discutir esse último tema, o Conselho convida, em 30 de março de 1982, o diplomata e deputado Álvaro Valle. Depois de explicar que, em geral, as tarifas são decididas em reuniões da International Air Transportation Association (IATA), principal associação do mercado de aviação, Valle polemiza ao dizer que ninguém no governo é entendido no assunto e defende mudança de postura da Varig, até então a única companhia aérea brasileira com voos internacionais. Segundo o diplomata, o modelo atual permite saúde e lucro à companhia, mas não serve ao país.

“De pouco adianta aumentar a capacidade hoteleira, desenvolver capacidade receptiva, com melhores agentes, dizer ao mundo que o nosso Pão de Açúcar é bonito, espalhar fotografias do Corcovado e fazer filmes para os americanos quando o importante é explicar que, para vir ao Brasil, ele [o turista] terá que deixar de ir três vezes à Europa. Por que vir ao nosso Rio de Janeiro se a decisão significa deixar de ir duas ou três vezes à Grécia? Por que trocar uma viagem a Londres, Paris, Roma, Lisboa etc. por uma viagem ao Rio, que custaria o dobro? Aí está o problema: nas tarifas aéreas.”

A reclamação vem em um momento no qual a Varig, devido a uma parceria com o governo, possuía o monopólio das rotas internacionais. Valle defende a livre concorrência.


“As rotas de que dispomos não são rotas entregues a uma companhia, mas ao governo brasileiro. A competição é saudável em todos os setores. Então por que estabelecer monopólio, mesmo que não estatal? Eu não defendo de forma alguma o monopólio estatal, a ingerência estatal em qualquer setor. Se definirmos a livre concorrência, a livre empresa, se existe concorrência, existe mais de uma empresa. No momento em que entregamos todo o transporte internacional brasileiro a uma só empresa, podem surgir facilmente contradições. (...) Isso é muito bom para a Varig. Mas pergunto: é bom para o Brasil?”

Deputado Álvaro Valle, em palestra no Conselho de Turismo da CNC.


Para reduzir os prejuízos causados pelos feriados à economia e estimular o turismo, em maio de 1982, Antonio de Oliveira Santos, presidente da Confederação Nacional do Comércio, propõe, em encontro com o presidente da República João Baptista de Oliveira Figueiredo (1918-1999), a alteração dos feriados do meio de semana para as segundas-feiras.

O Conselho também compra a briga da abertura do comércio nos fins de semana em cidades turísticas. A recomendação nasce em julho de 1983 durante uma convenção nacional promovida pela Embratur e pelo Conselho para debater a geração de empregos no turismo.

Os resultados das novas políticas implementadas pela Embratur com o suporte do Conselho, principalmente após o supracitado novo programa turístico de setembro de 1981, começam a aparecer com números importantes. O fluxo de turistas estrangeiros no país e o faturamento dos hotéis disparam, conforme mostram matérias nos jornais O Globo em 26 de abril e 5 de julho de 1984.

A verve do Conselho para impulsionar o turismo segue trazendo nomes relevantes para discutir a atividade. Em 28 de agosto de 1984, o convidado é João Alberto Leite Barbosa, presidente do Boletim Cambial, um dos mais respeitados jornais de economia da época. O jornalista afirma em sua palestra ser o turismo um dos mais dinâmicos e importantes segmentos da economia, sendo de vital importância, no próximo governo, a indicação de um profissional do setor para a presidência da Embratur. Barbosa faz um discurso de forte cunho social sob o tema “turismo, prioridade para o desenvolvimento”.

“Desejaria colocar na mente dos senhores alguns pontos básicos: a inflação, a recessão, o desemprego, os desequilíbrios sociais que se acentuam, a fome, o desespero e a violência. A inviabilidade de sobrevivência de todos os que trabalham até o nível de dez salários mínimos e que tenham responsabilidade de família.”

“(...) O cruzeiro vale hoje somente 0,005 centavos de dólar. Jamais se registrou na história nacional forma tão violenta de espoliação do povo do que as provocadas pela correção e a desvalorização da moeda.”

“(...) O turismo é dos setores econômicos com capacidade de absorver o mais rapidamente possível um grande contingente de mão de obra qualificada ou fácil de ser educada desde que já disponha de vocação.”

“(...) Turismo é atividade geradora de recursos e de empregos. É necessário um conjunto de serviços para atrair aqueles que fazem turismo e dispensar-lhes atendimento por meio de provisão de itinerários, guias, acomodações, transporte e muitos outros.”

João Alberto Leite Barbosa, presidente do Boletim Cambial, em palestra no Conselho de Turismo da CNC


A flexibilização da emissão de vistos para estrangeiros volta à tona em novembro de 1984. Os empresários do setor sabem da importância da medida para expandir a entrada de viajantes de grandes polos como Estados Unidos, Japão e França. Para apressar a medida, Arruda Falcão, presidente do Conselho de Turismo da CNC e representante da hotelaria no Conselho Nacional de Turismo, envia ao ministro da Indústria e Comércio, Murilo Badaró, uma proposta para atenuar a exigência de visto consular.

“O Brasil dispensa o visto para naturais de países sem expressão turística econômica, como Andorra, Bahamas, Barbados, Equador, El Salvador, Islândia e Granada, e exige o visto de turistas procedentes de países de efetivo potencial para exportar turistas, como Estados Unidos, Japão, Austrália e Nova Zelândia.”

Corintho de Arruda Falcão, presidente do Conselho de Turismo da CNC


A primeira edição do Rock in Rio, entre os dias 11 e 20 de janeiro de 1985, torna-se uma oportunidade para o carioca desempenhar o papel de bom anfitrião. Milhares de fãs desembarcam na cidade para ficar cara a cara com bandas nunca vistas na América do Sul. Queen, Iron Maiden, AC/DC e Scorpions dividem a programação com nomes nacionais, como Gilberto Gil, Moraes Moreira, Cazuza e Lulu Santos.

A trilha musical de 1985, no entanto, coube a Milton Nascimento. Na voz do cantor carioca, Coração de Estudante vira hino nacional durante as homenagens ao mineiro Tancredo de Almeida Neves, morto em 21 de abril, véspera da posse. O primeiro civil eleito presidente, ainda de forma indireta, após o regime militar é substituído pelo maranhense José Sarney. Três anos depois, em 5 de outubro de 1988, a primeira Constituição pós-ditadura é promulgada e cita o turismo com respeito.

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão e incentivarão o turismo como fator de desenvolvimento social e econômico.

Art. 180 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988


O ano de 1986 começa com importantes conquistas reivindicadas pelo Conselho de Turismo. A primeira delas foi a alteração dos feriados do meio de semana para as segundas-feiras. Os empresários também comemoram a transferência para a Embratur da responsabilidade no acompanhamento dos reajustes das diárias de hotéis de uma a três estrelas – para o Conselho, a decisão estimula a competitividade de preços e incentiva a livre iniciativa. Ainda em janeiro, acontece a I Conferência Nacional de Turismo, promovida pela Embratur. O evento, realizado no Hotel Glória, na praia do Flamengo, é considerado o primeiro no qual representantes de todos os segmentos do setor se envolveram diretamente para pensar a política de turismo. Em entrevista ao jornal O Globo de 16 de janeiro de 1986, Mac Dowell Leite de Castro, presidente da Embratur, diz: “A grande finalidade desse mutirão de ideias será convencer o governo federal de que o turismo deve ser encarado como prioridade”.

O movimento do Conselho pela regulamentação dos cassinos segue década adentro. Na reunião de 11 de abril de 1989, Trajano Ribeiro, o presidente da Riotur, empresa de turismo do Rio de Janeiro, dá um depoimento contundente a favor da proposição.

“Às vezes eu penso que estou em Chicago, em 1920. Estamos passando pelos problemas que as cidades americanas passaram na década de 20. Aquelas gangues controlando o tráfico de narcóticos, a bebida que era proibida, o jogo clandestino, o jogo de número, aquela coisa toda. No Brasil, se joga de tudo. O governo patrocina vários tipos de jogo de azar, loterias e tal. Por que acabaram com os cassinos?”

“Seria realmente uma pressão irresistível do poder de Roma, do poder eclesiástico, ou será que o desenvolvimento dos cassinos no Rio de Janeiro não atrapalharia o surgimento e o desenvolvimento de outros polos turísticos que têm a base no jogo? Esse é um papo que eu gostaria de levar com esse Donald Trump [o ex-presidente dos Estados Unidos era então um dos maiores empreendedores no setor]. Eu acho que proibiram o cassino no Brasil pelo mesmo motivo que se afirmava na época que nós não tínhamos petróleo aqui. Se nós começássemos a descobrir petróleo aqui, prejudicaríamos os interesses lá fora.”

“Todo mundo sabe que o cassino no Rio de Janeiro funcionava, dava certo, gerava empregos, ocupava os músicos e os artistas dessa cidade, permitia o surgimento de tantos artistas. Que mal fazia? Que mal faz? Nenhum mal. Se cassino fizesse mal, uma boa parte do mundo tinha sucumbido diante da desgraça do jogo. Não é isso que acontece, o Uruguai tem jogo, é uma maravilha, a Argentina tem jogo, é uma maravilha, a França tem jogo, a Itália tem jogo, os Estados Unidos têm jogo.”

“O jogo gera fluxo de turismo. Foi proibido no Brasil com a capa da moralidade cristã, que não foi suficiente para encobrir as coisas mais imorais que existem nesse país, que são essas crianças andando nas ruas maltrapilhas, famintas e não raro assaltando advogados na porta do fórum. Isso é a grande imoralidade que esse manto cristão na década de 40 não foi capaz de encobrir e nos escancara agora com a imensa ferida na sociedade brasileira. Eu sou favorável ao jogo, não faz mal nenhum, pelo contrário. Se fosse instituído no Brasil, contribuiria muito para resolver os grandes problemas do Rio de Janeiro, porque ser-lhes-ia certamente aplicado um imposto correspondente à rentabilidade do setor que haveria de contribuir muito para investimento na área social.”

Também na segunda metade da década, a atividade turística brasileira recebe um forte investimento em publicidade. Pelé, que havia abandonado os gramados em 1977, torna-se Embaixador do Turismo Brasileiro. A imagem do Rei do Futebol é utilizada pela Embratur em campanhas publicitárias ao redor do mundo. Se, por um lado, permanece um olhar raso e preconceituoso do órgão oficial sobre a imagem do País – com a continuidade do tripé mulher-Carnaval-futebol –, por outro lado, começam a aparecer peças mais elegantes sobre as belezas naturais, o turismo ecológico e as viagens de aventura. A vanguarda trazida à atividade pelo Conselho ajuda o turismo a ampliar seus horizontes.

Na reunião de fechamento das atividades, em 13 de dezembro de 1988, o presidente Arruda Falcão fala das conquistas do Conselho naquele ano:

“É momento de proclamarmos que este foi um exercício profícuo para o Conselho. Debatemos ideias, suscitamos debates, propusemos medidas e participamos em organismos e congressos do setor de várias providências e diversas propostas em benefício de nossa área de atuação. Podemos dizer que estamos realizados. E gratificados.”

Corintho de Arruda Falcão, presidente do Conselho de Turismo da CNC


“Festejando o advento do dólar de viagem ou de turismo, uma longa e penosa batalha de todos nós. Celebrando a extinção da ficha de hospedagem como instrumento compulsório e remunerado. Comemorando a elevação do turismo a mandamento constitucional, com a sua preceituação no artigo 180 da Carta Magna. E, sobretudo, tendo a alegria de constatar, diante dessas ocorrências, que, finalmente, o turismo passa a ter a sua realidade compreendida e corretamente avaliada no contexto econômico e social deste país.”


Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa)

A entidade sem fins lucrativos reúne operadoras de turismo, colaboradoras e empresas de representação de produtos e destinos, além de convidados. Responde por 90% das viagens organizadas de lazer comercializadas pela cadeia produtiva. Criada em 1989, promove ações e parcerias para valorizar as atividades empresariais. Antes da pandemia, em 2019, suas operadoras faturaram R$ 15,1 bilhões, embarcaram 6,5 milhões de passageiros e geraram um impacto econômico de R$ 14,9 bilhões para a economia nacional.

www.braztoa.com.br


Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel)

Representante de um setor que congrega cerca de 1 milhão de negócios e gera 6 milhões de empregos, a associação, desde a sua criação em 1986, trabalha e logra importantes avanços em prol do segmento de alimentação fora do lar, contribuindo para a construção de um Brasil mais simples para se empreender e melhor para se viver.

www.abrasel.com.br