Federação Nacional de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (FNHRBS)*
Três meses depois de sua fundação, em 23 de setembro de 1955, como Federação Nacional de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares, foi reconhecida como entidade coordenadora dos interesses da categoria econômica de hospedagem e alimentação fora do lar. É uma entidade sindical patronal de grau superior, com base em todo o território nacional, constituída com a finalidade de coordenação, defesa administrativa, judicial e ordenamento dos interesses e direitos dos empresários dos segmentos de hotelaria e gastronomia.
www.fbha.com.br
* Atualmente Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA)
“Acredito que os governos não tenham compreendido até hoje a importância que, economicamente, o turismo pode dar ao Brasil e só assim justifico o desinteresse – é bem esse o termo – com que as nossas autoridades veem os problemas turísticos, ao contrário de outros países da Europa e da América, que não poupam esforços e trabalho para aumentar a sua receita através do turismo.”
“Na França, por exemplo, os planos desenvolvidos pelo governo para incrementar o turismo conseguiram que o orçamento fosse aumentado em 400 milhões de dólares, nos anos de 1932 a 1954. No Haiti – uma república pouco maior que o nosso estado de Sergipe –, o turismo vem tendo um crescimento admirável, de ano para ano, e, em 1954, o número deles que lá estiveram ascendeu a 40.000. Estou citando assim ao acaso a França na Europa e o Haiti na América, e podia aumentar os exemplos citando a Inglaterra, onde no primeiro semestre de 1953 os turistas gastaram mais 120 milhões de libras.”
“Vê-se, assim, que o turismo, hoje em dia, pela sua importância econômica, faz parte do orçamento dos países, que por isso desenvolvem um trabalho inteligente e organizado para que os estrangeiros de todo mundo os visitem. Só entre nós é que não se dá ao turismo a importância devida, por mais que o comércio tente mostrar aos governos, por intermédio de suas entidades representativas, o que a sua organização e regulamentação trariam para o país. Estou lhe falando apenas da importância econômica do turismo como fonte de divisas. Mas é preciso não esquecer, como recentemente foi acentuado na reunião do Conselho Interamericano de Comércio e Produção, realizada no México com a participação do Brasil, que o turismo é um veículo dos mais eficientes para, estreitando as relações entre os homens, propiciar um ambiente fecundo para o desenvolvimento do comércio internacional. Aliás, o México representa o exemplo mais novo no campo do aproveitamento do turismo, graças à sua organização e à atenção que as autoridades lhe dispensam.”
“Por tudo isso é que devemos e precisamos olhar com atenção para o turismo, organizando-o e regulamentando-o. Não é bastante dizer que temos no Brasil paisagens magníficas, esplêndidas regiões, locais pitorescos que encantariam os turistas do mundo inteiro. O que é preciso é criar condições para que esses turistas, que demandam hoje em dia todas as nações da América, menos o Brasil, voltem seu interesse para cá, através das facilidades oferecidas pelo governo, facilidades existentes nos outros países, mas que nós não concedemos aos estrangeiros que nos queiram visitar, bastando lembrar a frase muito conhecida que afirma que desde a alfândega, o turista é tratado entre nós como um inimigo, e se quer levar, como ‘souvenir’, um coco da Bahia, as autoridades o tratam como contrabandista.”
“Isto não quer dizer que nós, do comércio, estejamos desanimados em conseguir todo o interesse das autoridades governamentais para os problemas do turismo. Absolutamente. Tanto maior a resistência que encontrarmos, tanto maior será o trabalho que desenvolveremos para conseguir quebrantá-la. Temos a certeza de levarmos a melhor no esforço que vimos desenvolvendo para que os governos deem ao turismo a importância que ele merece.”
Luis Roberto Vidigal, vice-presidente da CNC
O depoimento afiado de Luis Roberto Vidigal, então vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC), no início de 1955, vem embalado pelo sopro fresco de um mundo pós-guerra. O planeta levantava a cabeça. Uma mistura de reconstrução física e renascimento moral sucedem a década mais vergonhosa do século passado. A despeito dos primeiros empurrões da Guerra Fria, o futuro finalmente voltava a ser conjugado. Os anos 1950 buscavam recolocar o mundo nos trilhos.
Ciente da importância do turismo para a construção de uma nação, o dirigente convoca o governo brasileiro para embarcar em uma viagem ainda inédita no país. Antes de lamentar o fato de que o turista é tratado aqui como inimigo e contrabandista, Vidigal mostra números e dá exemplos de países de bem com o turismo, como a França, impulsionada pelo Plano Marshall, e o Haiti, ainda antes da ditadura sangrenta do médico François Duvalier (1907-1971), o Papa Doc.
No Brasil, incrédulo com a derrota para o Uruguai na Copa do Mundo de 1950 e ainda chocado com o suicídio de Getúlio Vargas (1882-1954), a industrialização toma fôlego. Certa estabilidade e o sabor da prosperidade, perdidos por conta dos conflitos na Europa, voltam aos lares sob a forma de enceradeiras, vitrolas e televisores. Materializando o desejo de ir e vir, os automóveis começam a ganhar as ruas – Kombis, Romi-Isettas, DKWs... Lá fora, as Big Three – Chevrolet, Ford e Chrysler –, influenciadas pela iminente corrida espacial, lançam carrões de design inspirados em foguetes.
O fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) também catalisa o desenvolvimento da aviação comercial. Os ingleses Comet e os norte-americanos Douglas e Constellation, primeiros jatos produzidos em série, passeiam pela atmosfera da Terra. A bordo de um Super G Constellation, em 2 de agosto de 1955, a Varig inaugura sua era intercontinental, com dois voos semanais para Nova York.
O planeta respira novos ares. O turismo floresce.
Na entrevista concedida em 2 de fevereiro de 1955, ao mesmo tempo que exalta a importância do turismo para a sociedade, o vice-presidente da CNC antecipa a assertividade e sintetiza as diretrizes do Conselho de Turismo, que a confederação criaria seis meses depois, no dia 10 de agosto. No discurso de abertura da primeira reunião do novo conselho, às 10h de uma quarta-feira, no nono andar do número 9 da rua Candelária, centro do Rio de Janeiro, João de Vasconcellos, presidente da CNC, saúda os presentes e assim os define:
“Homens que dedicam boa parte de suas atividades e de seu tempo ao ideal do aproveitamento das correntes turísticas do exterior, a fim de que, fora do país, também se conheçam a excelência do clima, a hospitalidade, as riquezas que o Brasil reserva para todos quantos queiram colaborar com ele no desenvolvimento de suas fontes de produção.”
João de Vasconcellos, presidente da CNC
Ao reunir formadores de opinião, representantes de entidades empresariais, instituições educacionais e organizações governamentais, o Conselho nasce com os objetivos de ser órgão consultivo do governo, de assessorar o setor e estudar os principais desafios para a atividade turística no Brasil.
Os primeiros conselheiros empossados para iniciar a jornada foram líderes de associações fortemente ligadas ao turismo: Edgard Chagas Dória, do Touring Club do Brasil; Sílvio Américo Santa Rosa, do Automóvel Club do Brasil; Emílio Lourenço de Souza, da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH); George D. Craddock, do Centro de Navegação Transatlântica; Umberto Stramandinoli, do Serviço Internacional de Viagens e Turismo S.A.; José Tjurs, do Hotéis Reunidos S.A.; e Fernando Saldanha da Gama Frota, da Associação Brasileira de Turismo.
Uma leitura da longa ata inaugural, datilografada em 24 laudas, sinaliza as demandas primordiais do novo conselho. Um dos primeiros a tomar a palavra naquela manhã histórica, o conselheiro Santa Rosa levanta reivindicação antiga da CNC e a sugere como a “primeira ideia para início dos trabalhos”: a liberação de visto para cidadãos americanos – exceto norte-americanos e canadenses.
“[O conselheiro] julga conhecido de todos, que, após ingente luta, travada por elementos interessados no turismo, fora conseguida do Congresso Nacional, principalmente devido aos esforços profícuos do conselheiro Umberto Stramandinoli, lei autorizando o governo a dispensar o visto no passaporte dos cidadãos americanos. A lei fora regulamentada. O visto, pela disposição legal, não seria exigido. No entanto, o regulamento obriga o cidadão americano a ir ao consulado para seu documento ser carimbado com a expressão ‘Visto Dispensado’. Então, o primeiro trabalho do Conselho devia ser o esforço para que essa regulamentação fosse modificada.”
Ainda com a palavra, o conselheiro, representante do Automóvel Club do Brasil, fala das condições de nossas rodovias e enaltece, como “uma vitória de grande significação turística”, a obra realizada perto de Itajubá (MG) para reduzir o percurso e encurtar a distância entre Caxambu (MG), estância hidromineral famosa no período, e Campos do Jordão (SP). À época, por conta da descoberta da penicilina, a cidade paulista da Serra da Mantiqueira deixava parcialmente de lado seu atrativo terapêutico e começava a desenhar sua vocação turística. Pensões para pacientes com tuberculose transformavam-se em hotéis de férias e o crescente fluxo requeria melhor infraestrutura de acesso.
“Um trecho de dez quilômetros obrigava a uma volta por São José dos Campos para se atingir essa cidade de veraneio. Talvez em um mês ou em dois meses já se possa ir muito mais rapidamente a Lorena, Piquete, Itajubá e, afinal, Campos do Jordão”.
Ao tomar o microfone, o conselheiro Emílio Lourenço de Souza mostra-se preocupado com a falta de segurança, um evidente impeditivo ao crescimento turístico. O representante da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH) diz não adiantar propaganda das “belezas e de tanta coisa boa e útil da terra brasileira, se não for preparado convenientemente o povo e não se resguardar o turista desses costumeiros assaltos, que realmente existem, apesar de todos os esforços em contrário. O problema é ingente, e urge congregarem-se esforços para solucioná-lo.”
“A política do turismo deve ser encarada com senso objetivo, em termos de economia, a par do aspecto idealístico, sentimento inseparável das boas causas. Mas a despeito desse aspecto, não se deve deixar de encarar o turismo como uma expressão de aumento da riqueza nacional, como quem se ocupa dos problemas do café, da expansão da produção agrícola em geral, dos assuntos relacionados com o desenvolvimento da indústria e o aperfeiçoamento da agricultura, porque o turismo, ao lado do seu aspecto confraternizador, é também expressão de riqueza.”
Conselheiro Emílio Lourenço de Souza
Em julho de 1955, às vésperas da criação do Conselho, o Rio de Janeiro havia recebido o 36º Congresso Eucarístico Internacional. O encontro motivara a realização de grandes obras na cidade, como a ampliação da adutora do Guandu e parte do aterramento do Flamengo, onde futuramente seria o Parque do Flamengo e o Monumento aos Pracinhas. A primeira fase do aterramento, entre a rua Santa Luzia e o Passeio Público, deu origem à Praça do Congresso, onde o evento foi realizado.
Sob os reflexos do Congresso Eucarístico Internacional, que trouxe centenas de milhares de turistas para o Rio de Janeiro e colocou o país no foco das atenções mundiais, deixando um legado de obras, o Conselho de Turismo da CNC debate questões de infraestrutura urbanística e a ampliação do turismo receptivo e de hotéis.
É nesse clima que nasce o maior projeto imaginado para o turismo brasileiro à época: o Centro Balneário Turístico de Copacabana. A proposta ousada e, sabe-se hoje, 65 anos depois, não concretizada, parte do conselheiro Edgard Chagas Dória. Em nome do Touring Club do Brasil, ele propõe a criação de um complexo para receber viajantes na mais famosa praia brasileira nos anos 1950 – e talvez ainda hoje.
Os estudos estavam adiantados. Com custo de 400 milhões de cruzeiros e faturamento anual estimado em 30 milhões de dólares, o empreendimento seria erguido pelo governo federal em parceria com a prefeitura em um imenso terreno pertencente ao Estado Maior das Forças Armadas. Contaria com 1.500 apartamentos, auditório, cinema, teatro, boates e uma galeria oceânica que ligaria o Arpoador à praia de Copacabana. Nomes icônicos da arquitetura nacional, como Oscar Niemeyer (1907-2012), Lucio Costa (1902-1998), Sérgio Bernardes (1919-2002) e os irmãos Marcelo e Maurício Roberto, já haviam manifestado interesse em desenhar o projeto. Quem fala sobre o projeto é Dória, do Touring Club do Brasil:
“Para se atrair o turismo internacional, para se ter correntes turísticas substanciais, é preciso oferecer, antes de tudo, condições de hospitalidade, instalações hoteleiras em quantidade e qualidade adequadas. Os hotéis do Rio de Janeiro não se acham em condições de receber a sobrecarga de 1.500 hóspedes de qualidade, como devem ser os turistas norte-americanos. Inegavelmente, Copacabana desfruta de grande prestígio no exterior. Construir-se um hotel de turismo fora de Copacabana é desprezar elementos de maior importância sob o aspecto da propaganda. As pessoas que vierem ao Rio de Janeiro para se hospedarem em hotéis preferirão os dessa praia. Mas, infelizmente, já não existem terrenos disponíveis em Copacabana para a construção de novos hotéis.”
Conselheiro Edgard Chagas Dória, do Touring Club do Brasil
O argumento utilizado à época era o da necessidade de aumentar a oferta hoteleira. Defendia-se que o Brasil, no caso, o Rio de Janeiro, não tinha hotéis de beira de praia, como os existentes no Caribe, nos quais a rua passa atrás do prédio e não pela frente. Desejava-se também um centro turístico no qual o viajante pudesse ficar sete dias hospedado sem a necessidade de sair.
“Parece não existir coisa semelhante no mundo. O conjunto se inicia no fim da praia de Copacabana. A entrada do turista se fará por um túnel, desde as areias da praia, no ponto onde atualmente se situa o clube Marimbás. Para atender às predileções dos turistas, pretende-se construir uma grande estação marítima, a fim de que os hóspedes, logo ao saírem do hotel, tomem lanchas para excursões e pescarias em alto-mar. Haverá esse aspecto extraordinário de se iniciar o balneário na praia de Copacabana. A entrada comercial, porém, seria no Arpoador, em rua a ser aberta, de modo a permitir que o hotel se projete sobre a praia. Não existe no Rio de Janeiro hotel situado sobre a praia.”
Pelo modelo de negócio apresentado, o setor privado construiria as 1.500 unidades habitacionais e o setor público arcaria com o restante do complexo, ficando com o patrimônio. Sobre o projeto, que morreria na praia por não ter obtido a liberação do Estado Maior das Forças Armadas, a professora Maureen Flores, conselheira e consultora especializada em turismo, diria meio século depois, em 2007:
“(...) Havia uma demanda grande para um projeto que aumentasse a capacidade hoteleira do Rio de Janeiro. Dizia-se que se tentássemos realizar um evento para 1.500 pessoas, por exemplo, não haveria capacidade hoteleira suficiente para essa sobrecarga. E eles queriam que fossem hotéis de qualidade, porque se pensava, naquela época, que os turistas norte-americanos – que constituíam o nosso mercado prioritário – tinham alto poder aquisitivo.”
“(...) Esse projeto não aconteceu por causa do Exército – graças a Deus! É por causa desse tipo de empreendimento que a Espanha está implodindo hoje. Era um momento do turismo de 50 anos atrás e que não existe mais. As prefeituras da Espanha estão implodindo vários hotéis com esse modelo.”
A busca por uma hotelaria de qualidade leva à criação da Federação Nacional de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (FNHRBS). A assembleia de fundação do órgão acontece em 23 de setembro de 1955 e reconhece a federação como entidade coordenadora dos interesses da categoria econômica de hospedagem e alimentação fora do lar, conforme a carta sindical assinada em 30 de dezembro do mesmo ano.
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae)
Em 1972, foi criado o Centro Brasileiro de Assistência Gerencial à Pequena Empresa (Cebrae). A partir de 1982, o Cebrae passou a reivindicar mais atenção governamental às micro e pequenas empresas. Em 1990, o Cebrae se transformou em Sebrae, uma instituição privada sem fins lucrativos. De lá para cá, ampliou sua estrutura de atendimento para todos os estados brasileiros, capacitou milhões de pessoas e contribuiu para a criação e o desenvolvimento de milhares de micro e pequenos negócios por todo o país. No turismo, presta atendimento direto aos pequenos negócios, incentivando o empreendedorismo, participando nas discussões das políticas públicas, apoiando o desenvolvimento territorial e realizando estudos e pesquisas sobre o setor. O Sebrae promove a competitividade e o desenvolvimento sustentável das micro e pequenas empresas. Atua com foco no fortalecimento do empreendedorismo e na aceleração do processo de formalização da economia por meio de parcerias com os setores público e privado, de programas de capacitação, de acesso ao crédito e à inovação e pelo estímulo ao associativismo, a feiras e rodadas de negócios.
www.sebrae.com.br
A despeito dos embates pouco frutíferos com membros do governo federal em busca de apoio oficial para desenvolver o turismo no país, os resultados da luta do Conselho são visíveis desde os primeiros passos. Em 1955, com forte incentivo do braço de turismo da CNC, o Decreto 36.315 determina o fim da exigência de visto para cidadãos americanos. No mesmo ano, acontecem o III Congresso Nacional do Turismo, em Salvador, e o congresso anual da Asta (sigla em inglês para a Sociedade Americana de Agentes de Viagens), em Lausanne, na Suíça. Além de enviar uma delegação para participar do evento na Europa, o país lança a candidatura do Rio de Janeiro para sediar a edição seguinte do congresso, prevista para dali a quatro anos.
O primeiro encontro para tratar da elaboração de um plano diretor para o turismo acontece na tarde do dia 5 de abril de 1956, em uma reunião pública com a participação de convidados – “homens de experiência, de todas as classes e atividades a fim de ampliar o campo de ação”, nas palavras de Jessé Pinto Freire, presidente em exercício da CNC. Além dos conselheiros, sentam-se para debater desde cidadãos interessados a representantes de companhias aéreas. A despeito de ter ainda menos de um ano de vida, o Conselho é tratado como o “órgão máximo de coordenação da iniciativa particular nos setores de turismo em todo o país”. A reunião vagueia por temas diversos da atividade turística. O conselheiro Umberto Stramandinoli traz a informação de que a partir do dia 23 daquele mês, as quatro companhias aéreas que serviam a América do Sul – Panamerican, Brannif, Panagra e Varig – reduziriam em 30% o preço das passagens para turistas norte-americanos. Disse ainda que as quatro empresas investiriam 600 mil dólares para propaganda nos Estados Unidos. Segundo o conselheiro, uma quantia aquém da necessária.
Após observar que a publicidade no exterior deveria ser responsabilidade do governo, Sebastião Sampaio, ex-embaixador brasileiro nos Estados Unidos, dá um depoimento sobre o florescimento da atividade turística nos anos 1950:
“Não é mais simples viagem de homens ricos, que se querem distrair. O homem abastado, melhor, o americano de recursos, não interessa tanto aos outros povos como o homem da classe média. Com as facilidades atuais do transporte aéreo, o turismo é uma das maneiras de fazer com que homens livres, que tenham algum dinheiro com valor aquisitivo, gozem suas férias fora das fronteiras da própria pátria.”
Segundo o ex-embaixador do Brasil, o jornal New York Times afirmara que os turistas americanos da classe média gastariam em 1956 no exterior a importância de 1 bilhão de dólares.
“O fato é, para eles, como para nós, de tamanha importância que atualmente na América do Norte as férias não são apenas de quinze dias. Inúmeras indústrias e empresas comerciais concedem período maior de descanso para facilitar aos seus empregados viagem de turismo ao exterior.”
A ata da reunião traz uma série de depoimentos com preocupações que apontam a necessidade de um cuidado maior com a cidade no que diz respeito à limpeza urbana, à segurança, à poluição sonora, à falta de saneamento e à conservação das praias. Sobre o descaso da prefeitura com o mar, o jornalista Aníbal Cardoso Júnior, do Diário Notícias, afirma:
“Na zona sul, em Copacabana, considerada a parte turística por excelência da cidade, a imundície é ainda maior. Na altura da rua Santa Clara, por exemplo, o elevador subterrâneo despeja na praia, não águas pluviais, mas águas de esgotos sanitários. Esta é a realidade. Os tais emissários são apenas e vergonhosamente águas poluídas de esgotos.”
Em matéria do Jornal do Brasil, de 3 de abril de 1956, às vésperas da reunião supracitada sobre o plano diretor, o presidente do Conselho, Rivadávia Caetano da Silva, busca apressar a tomada de decisões por parte do governo em relação à criação do Departamento Nacional de Turismo:
“Embora já exista em tramitação na Câmara Federal um projeto de lei criando um Departamento Nacional de Turismo, continua sendo ele apenas um projeto, há bastante tempo, quando, há muito, já deveria ter sido convertido em lei. Cada dia se torna mais necessária a criação de um órgão de âmbito nacional, bem orientado, bem dirigido, capaz de supervisionar de forma esclarecida o trabalho de numerosas entidades existentes no país, que, por esforço próprio, cuidam do turismo. (...) Foi exatamente em face da tal situação que a Confederação Nacional do Comércio (...) criou o seu Conselho de Turismo, procurando, objetivamente, coordenar os esforços (...) no sentido de dar ao turismo brasileiro bases concretas e possibilidades de ampliação sempre maiores e mais compensadoras.”
Rivadávia Caetano da Silva, presidente do Conselho de Turismo
Três dias depois, no jornal O Globo, Jesse Pinto Freire, presidente em exercício da CNC, faz coro com Caetano da Silva e evidencia o desejo dos conselheiros de elevar o turismo a fato essencial para o desenvolvimento do país:
“Não se pode mais continuar na prática de um turismo de ocasião, improvisado, de emergência. Em certas épocas, mormente no Carnaval, fala-se em levas de turistas. Na verdade, um ou dois navios trazem dos Estados Unidos o que se poderia chamar de corrente turística, mas é só. (...) Muito representará a exploração industrial do turismo e o seu bom aproveitamento para a depauperada economia brasileira. Disso, aliás, já tomou conhecimento o governo, quando assinala na mensagem presidencial ao Congresso que é tempo de o Brasil se compenetrar da importância do seu patrimônio turístico, transformando-o, por meio de um trabalho de valorização conveniente e de exploração industrial adequada, em ativo fator de enriquecimento, cultura, propaganda, aprimoramento político e bem-estar social.”
O plano diretor transforma-se em uma série de medidas de emergência focadas em, por exemplo, realizar melhorias urbanísticas em duas cidades turísticas: Campos do Jordão, em São Paulo, e Cabo Frio, no Rio de Janeiro. O texto explicita ainda o pedido de apoio do governo para a realização no país da reunião da Asta, em 1959 (o Brasil, no entanto, só receberia o evento duas décadas mais tarde, em outubro de 1975, após grande concorrência internacional). Essa necessidade de tornar as cidades turísticas acolhedoras para viajantes leva o Conselho a realizar reuniões públicas para levantar os problemas dos municípios mais promissores. Além de Campos do Jordão e Cabo Frio, a mobilização torna possível um trabalho efetivo em prol do desenvolvimento de Foz do Iguaçu.
“Reunimo-nos em congressos regionais ou nacionais, conferências e mesas-redondas, em que estudamos e debatemos problemas econômicos, sociais e políticos do país e apresentamos aos poderes públicos as sugestões impessoais e despidas de sentido classista, para as altas soluções que nossos conhecimentos e experiências aconselham. Mas, do mesmo passo, sabemos criar em nossas entidades de classe organismos de assistência social e de formação profissional [referência ao Sesc e ao Senac], por espontânea e exclusiva iniciativa, mantidos apenas com as contribuições de nossos empregadores.”
“Este Conselho de Turismo se inclui entre essas iniciativas despidas do interesse pessoal, de grupo ou de classe, que visam colaborar com os poderes públicos e com as demais entidades, no sentido do interesse comum.”
João de Vasconcelos, presidente da CNC, em reunião sobre o novo plano urbanístico para a cidade de Cabo Frio (RJ)
Em entrevista ao jornal O Globo de 30 de abril de 1956, o conselheiro Umberto Stramandinoli, também presidente do Sindicato das Empresas de Turismo no Rio de Janeiro, faz um excelente apanhado da atividade turística e das realizações do ainda recém-nascido Conselho de Turismo da CNC. Stramandinoli pede o engajamento do governo e fala sobre a criação de uma frente sul-americana para trabalhar o turismo de forma continental.
“Embora pareça um tanto paradoxal, a verdade é que o período de pós-guerra tem como característica um fenômeno econômico-social dos mais curiosos, com o florescimento do turismo em moldes até então ainda não observados. A impressão é de que os povos, contidos durante a guerra em suas fronteiras, logo que lhes foi possível, saíram à procura de novos horizontes. A maioria das nações europeias e americanas tratou, então, de aproveitar-se dessa situação privilegiada e preparou-se, criando assim condições favoráveis à prática do turismo. Este, nos primeiros anos do após guerra, cooperou de forma efetiva para reconstrução da economia europeia.”
“Mesmo aqui na América do Sul, países vizinhos, como Uruguai, Argentina, Chile e Peru, criaram organizações estatais destinadas a fomentar o turismo em todas as suas formas e modalidades. O Brasil continuou alheio a esse movimento. Algumas tentativas esparsas, como a comissão criada para o estudo de um órgão estatal de turismo, não tiveram maiores consequências. O projeto organizado pela referida comissão, depois de revisto pelo DASP [Departamento Administrativo do Serviço Público] e enviado ao Congresso com mensagem do presidente [Getúlio] Vargas, ficou esquecido na Câmara dos Deputados.”
“Creio que estamos no caminho de, afinal, fazer com que o país acorde para essa fonte segura de divisas. Sentindo os gravíssimos prejuízos que adivinham para o Brasil devido à inexplicável atitude dos nossos dirigentes, a Confederação Nacional do Comércio, por decisão unânime de seu conselho de representantes, resolveu criar seu Conselho de Turismo, dando-lhe forma eclética, pois, além de representantes do comércio propriamente dito, fazem parte da entidade representantes da hotelaria nacional, das agências de viagem e turismo, dos transportes aéreos e marítimos e das associações civis dedicadas ao turismo, como o Automóvel Clube do Brasil, o Touring Club do Brasil e a Associação Brasileira de Turismo.”
“Constituído o Conselho há seis meses, pôs-se imediatamente em campo, e sua primeira iniciativa foi a de remover um dos empecilhos que vinham dificultando as viagens de turismo para o Brasil dos cidadãos dos países americanos, obtendo aprovação da lei que os isentou de visto consular em seus passaportes. É de justiça mencionar que para a votação dessa lei contou o Conselho com apoio do Senado. Mais tarde, empenhou-se para que o Brasil se fizesse representar no congresso anual da Asta, a Sociedade Americana de Agentes de Viagem, realizado em outubro do ano passado em Lausanne, tendo sido uma delegação de seus membros portadora de um convite do governo para que essa associação realize sua convenção em 1959 no Rio de Janeiro.”
“Graças à iniciativa do movimento, tomamos parte ativa no III Congresso Nacional de Turismo, realizado na cidade de Salvador, em novembro último, logrando que se organizasse uma comissão executiva desses congressos e fosse, ao mesmo tempo, reconhecido como órgão cúpula da iniciativa particular em questões de turismo. Vem se empenhando, ainda, para a valorização turística de várias regiões brasileiras, entre as quais a das Cataratas do Iguaçu, região de incomparável beleza, relegada ao abandono pela falta de visão de nossos governantes.”
“Nesse sentido, bate-se por uma organização colegiada em que as entidades particulares, direta ou indiretamente interessadas no turismo, cooperem com o Estado na solução dos problemas atinentes ao turismo. É necessário, porém, que se forme uma frente única e coesa contra a excessiva intervenção estatal, impedindo, se possível, a burocratização de serviços que devem, pela sua natureza específica, ter flexibilidade para melhor atender a seus fins.”
“O Conselho de Turismo da CNC tem um plano que abrange todo o país. Dele – além da criação de um órgão federal que se incumba do estudo e da solução dos problemas concernentes ao turismo, bem como da propaganda do Brasil no exterior –, deveria ser objeto de consideração a classificação das regiões de turismo do Brasil, de acordo com sua importância e suas possibilidades imediatas de exploração, estabelecendo determinadas prioridades para seu aparelhamento turístico. O problema é, por sua natureza, complexo, e, se não for possível estabelecer-se um perfeito entrosamento entre a ação do Estado e a iniciativa particular, acreditamos que não seja possível criar algo construtivo nesse setor.”
“Quanto à promoção do Brasil, como destino turístico, no exterior, tem sido nula a ação do governo. Todo esforço para lograr esse objetivo é das organizações particulares, sejam elas empresas hoteleiras, organizações de transporte ou agências de viagens. Visa o Conselho de Turismo da CNC organizar um trabalho coordenado, nesse sentido, propondo no VI Congresso Interamericano de Turismo que se organize uma comissão sul-americana de turismo que tenha a seu cargo a propaganda turística da América do Sul no exterior.”
“Essa propaganda conjunta, além de ser menos onerosa para cada país integrante, seria mais eficiente. (...) Nossas aspirações são grandes. Não desejamos fazer trabalho pessoal, mas estabelecer um plano em conjunto que beneficie todo o país. Para isso, solicitamos o apoio de todos quantos se interessam pelo turismo e queiram colaborar conosco, enviando-nos suas sugestões.”
Manobra importante comandada pelo Conselho de Turismo da CNC dá-se em 21 de junho de 1956, quando, na sede da rua Candelária, representantes do Brasil e dos Estados Unidos assinam um acordo para melhorar a estrutura do turismo brasileiro e aumentar o número de visitantes norte-americanos no país. O acordo fez parte do Ponto IV, programa de cooperação técnica internacional em diversas áreas entre Estados Unidos e os países latino-americanos proposto pelo presidente Harry Truman (1884-1972) em seu discurso de posse, em janeiro de 1949.
Desse acordo, surge uma missão – composta por três brasileiros e dois norte-americanos que rodaram 19 mil quilômetros pelo Brasil e passaram dois meses em estudos nos Estados Unidos – que resultou, anos depois, em relatório em dois volumes assim nomeados: “Condições Internas que Entravam o Turismo” e “Como Alcançar o Turista Americano”.
União Nacional dos Convention & Visitors Bureux e Entidades de Destinos (Unedestinos)
Instituída em 2015, é uma organização não governamental de direito privado, constituída sob a forma de associação sem fins lucrativos e formada por entidades privadas, públicas e mistas, especializadas em promoção de destinos, pesquisas, geração de conteúdo, programas de capacitação, apoio e captação de eventos em geral. Compartilhamento, integração e relacionamento são os seus principais pilares. Tal organização trata de tendências, conceitos, movimentos do dia a dia do trabalho de captação e de eventos e promoção de destinos, participando dos debates e das pautas de interesse do setor de viagens, de eventos e de turismo com legitimidade. Possui em sua gestão a participação de consultores técnicos especializados nas mais diversas áreas do setor, com 45 entidades associadas, representando 300 destinos e cerca de 10.000 empresas associadas.
www.unedestinos.com.br
O ano de 1956 também fica marcado pela realização do primeiro Congresso Internacional do Turismo Social. O encontro, na cidade de Berna, na Suíça, vem na esteira de normas pós-guerra que, entre outros direitos, proporcionavam férias remuneradas para trabalhadores de diversos países – no Brasil, o direito já havia sido garantido desde 1º de maio de 1943, com a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), sancionada pelo presidente da República Getúlio Vargas. As férias remuneradas compreendiam o período de 15 dias em 1943, chegando a 20 dias em 1949 (Lei nº 816), e alcançariam os 30 dias em 1977 (Lei nº 1.535). A democratização do lazer, com a garantia de descanso remunerado, ajudou a alavancar o número de viagens pelo mundo.
Já em 1958, ano em que a CNC define em estatuto o turismo como uma de suas prioridades, surge o que pode ser considerada a primeira política pública do governo brasileiro a serviço da atividade turística. No dia 21 de novembro, o Decreto federal 44.863, assinado pelo presidente da República Juscelino Kubistchek (1902-1976), cria a Comissão Brasileira de Turismo (Combratur). O órgão, vinculado à presidência, nasce com a responsabilidade de coordenar as atividades destinadas ao desenvolvimento do turismo e a entrada de estrangeiros.
Entre os integrantes da comissão, além de membros de nove ministérios, são nomeados representantes de confederações do comércio, da indústria e da agricultura e de associações de imprensa e propaganda. Pelo estatuto do órgão, entre os quatro nomes da Confederação Nacional do Comércio, era preciso garantir um representante dos agentes de viagens, um das empresas de transportes e um da hotelaria.
Com o gradual e constante desenvolvimento do turismo no país, as agências de viagem, que já possuíam um decreto dispondo sobre seu funcionamento desde 1938, finalmente se organizam e criam suas próprias associações. Em 1959, entre os dias 25 e 28 de agosto, em São Paulo, o Conselho de Turismo da CNC e a Combratur patrocinam o primeiro congresso da Associação Brasileira de Agências de Viagem (Abav). Um dos temas do evento foi a elaboração do projeto de regulamentação da profissão dos agentes. Nesse mesmo ano, as companhias aéreas brasileiras Varig, Vasp e Cruzeiro firmam acordo para operar em conjunto o trecho Rio-São Paulo, dando origem à Ponte Aérea e tornando mais acessíveis as idas e vindas entre as duas importantes cidades.
Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav)
Criada em 1953 – antes da criação do Conselho de Turismo da CNC em 1955 –, a associação é uma das principais entidades de turismo no Brasil. Está presente em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal. Sua base é composta por 2,4 mil empresas associadas, entre agências de viagens, operadoras e consolidadoras, que respondem por cerca de 80% da movimentação de vendas. A Abav Nacional tem grande capilaridade e forte representação política. Promove cursos, palestras e convênios de cooperação e gestão.
www.abav.com.br
Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH)
Com sede em Brasília e mais de 80 anos de atuação, a ABIH Nacional é a entidade de classe mais antiga do turismo brasileiro, consolidando-se como importante agente na defesa dos interesses da indústria de hotéis do país. Por meio das ABIH’s estaduais, sua representatividade se estende pelos 26 estados e pelo Distrito Federal. Seu principal objetivo é o fortalecimento das relações institucionais, garantindo a defesa dos interesses do setor e a valorização da atividade econômica da hotelaria. É uma entidade empresarial associativa sem fins lucrativos, que representa os meios de hospedagens associados.
www.abih.com.br
Entre os dias 18 e 24 de outubro de 1959, o Conselho de Turismo participa ativamente do XI Congresso Nacional Hoteleiro. Às vésperas da abertura do evento, o conselheiro Stramandinoli salienta que as maiores deficiências do equipamento turístico brasileiro “dizem respeito à hotelaria”. Quanto às medidas necessárias para o desenvolvimento hoteleiro, Stramandinoli cita as seguintes, em matéria publicada no jornal O Globo em 24 de setembro do mesmo ano:
1) organização de uma comissão técnica dedicada ao estudo dos problemas da hotelaria nacional;
2) campanha de esclarecimento e persuasão dos poderes públicos para que o turismo seja considerado um fator do desenvolvimento econômico do país;
3) legislação própria para o financiamento de construção de hotéis e reformas dos atuais;
4) isenção de impostos por período não inferior a 15 anos em caso de novos estabelecimentos e de 10 para os já existentes, desde que se ampliem suas instalações, e;
5) levantamento dos atrativos turísticos de todo o país para a formação do Patrimônio Turístico Nacional.
O Conselho de Turismo fecha a década de 1950 como referência maior do setor. Em seus primeiros anos de vida, a entidade adquire profundo conhecimento do processo que envolve a atividade. Os conselheiros, em reuniões frequentes, com debates sempre embasados, trabalham arduamente para despertar o entendimento, por parte dos poderes públicos e da sociedade, da importância econômica e social do turismo para o país. Aos poucos, viajar passa a fazer parte da agenda do brasileiro. O turismo ganha importância na sociedade e chega aos gabinetes políticos.